segunda-feira, 2 de julho de 2012

Um clube acima da lei

As leis, em princípio, devem ser cumpridas por todos, sem distinção ou privilégio de qualquer espécie. Na prática, sabemos, não é assim. Isso se confirma, mais uma vez, com a absurda liberação do estádio Beira-Rio para a realização de jogos. O estádio se encontra em obras e, por questões óbvias de segurança, já devia ter sido interditado há muito tempo. Três procuradores do Ministério Público, agindo de acordo com o que se espera de quem ocupa tão importante função, encaminharam o pedido de interdição, que foi, inicialmente, deferido. A partir daí, num episódio deprimente, o Inter e a imprensa esportiva do Rio Grande do Sul, historicamente simpática ao clube, passaram a tecer comentários desabonadores em relação aos procuradores, tachando-os de gremistas. A CBF, instituição que rege o futebol brasileiro e que deveria ser a primeira a zelar pelo cumprimento do Estatuto do Torcedor, passou por cima do mesmo e concedeu ao Inter 72 horas a mais de prazo para a definição do local do jogo contra o Cruzeiro, no dia 07/07. Como consequência, o Inter dispôs de mais tempo para agir e conseguiu, hoje, a liberação do estádio Beira-Rio. Ainda que essa decisão possa vir a ser reformada, trata-se de um escândalo, de uma afronta aos mais elementares princípios de defesa do interesse público. Todos os estádios relacionados para a Copa do Mundo de 2014 tiveram suas atividades suspensas para a realização de obras. Só o Beira-Rio, até agora, é exceção. Porquê? O poder do Inter nos bastidores é algo que sempre me chamou a atenção. Com uma imprensa esportiva local dócil e fiel aos seus interesses, o Inter opera, também, com enorme desenvoltura, nos tribunais esportivos e em todos os estamentos de poder. O que para os outros é lei, para o Inter é letra morta. O clube tornou-se um ente sobre-estatal, que paira acima das leis e das autoridades. A decisão de hoje, ainda que libere para o público apenas o anel superior do estádio, é injustificável. Concede ao Inter, em detrimento a todos os demais clubes que tiveram os estádios em que costumeiramente jogam interditados, um privilégio descabido e nauseante. Mais uma vez, fica provado que, no Brasil, alguns podem bem mais do que outros e, nesses casos, a lei, a ética, o bom senso e o interesse público são pisoteados. Triste realidade de um país que avança economicamente, mas que, no plano das questões sociais, ainda adota conceitos arcaicos, típicos da época dos coronéis, em que prevalece o "sabe com quem você está falando?". A vitória obtida pelo Inter, hoje, no campo jurídico, é uma derrota da sociedade e do estado de direito.

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