segunda-feira, 29 de junho de 2015

Tiranias culturais

As mortes do cantor sertanejo goiano Cristiano Araújo, e do folclorista e compositor gaúcho Antônio Augusto Fagundes, ambas ocorridas na semana passada, evidenciaram o quanto a opinião pública é exposta à tiranias culturais. O Brasil, já de algum tempo, vive um massacre midiático de culto a chamada "música sertaneja". Duplas sertanejas pululam no rádio e na televisão, a cada dia parece surgir uma nova. Nos últimos anos, surgiu uma variante desse gênero musical denominada "sertanejo universitário", ainda que não se saiba definir exatamente o que a caracterize. Em comum, o que as músicas dessas duplas, desde as mais famosas como "Chitãozinho e Xororó" e "Zezé Di Camargo e Luciano", até às mais obscuras, tem em comum são composições primárias e simplórias, com melodias de fácil assimilação e letras pobres, cheias de clichês e de um sentimentalismo rasteiro. A cobertura da morte de Cristiano Araújo foi um exemplo desse descalabro que é a badalação aos sertanejos por parte da mídia. Cristiano estava longe de ser uma unanimidade nacional, e não havia colecionado tantos sucessos assim em sua carreira. Porém, as redes de TV, em particular a Globo, deram à sua morte um tratamento equivalente ao falecimento de um chefe de Estado. Como vivemos uma época em que a verdade é golpeada e a mentira é glorificada, o jornalista Zeca Camargo, ao criticar essa situação, foi alvo de comentários irados nas redes sociais, que o levaram a se retratar. Obviamente, muitas pessoas, provavelmente a maioria, não apreciam música sertaneja, mas estabeleceu-se um predomínio dos artistas desse gênero nos meios de comunicação, que culminou na despropositada comoção em torno da morte de Cristiano Araújo. Em escala estadual, ocorreu o mesmo, no Rio Grande do Sul. A morte de Antônio Augusto Fagundes teve uma ampla cobertura, dado ser um dos grandes nomes do chamado "nativismo", ou seja, de um movimento que cultua as "tradições gaúchas". A presença do movimento tradicionalista na mídia é tão ostensiva que induz a se pensar que todos os habitantes do Estado se identificam com ele. Não é verdade. Há muitos gaúchos que não apreciam as músicas e hábitos nativistas. A cultura é algo plural, não pode ser dominada por algumas vertentes. A música sertaneja não é uma preferência nacional, bem como o gosto pelo tradicionalismo não é predominante no Rio Grande do Sul.