terça-feira, 23 de junho de 2015

Desonestidade escancarada

A revelação de uma gravação, por escuta autorizada, de uma conversa entre o ex-presidente da Associação de Futebol da Argentina (AFA), Júlio Grondona, e Abel Gnecco, representante argentino na comissão de arbitragem da Conmebol, é a confirmação do quanto o futebol, o mais apaixonante dos esportes, está tomado pela sujeira, em todos os níveis. Desonestidade escancarada, sem disfarces. Grondona, falecido em 2014, e Gnecco, que participa da comissão de arbitragem da Copa América que está sendo jogada no Chile, dialogavam a respeito da atuação do paraguaio Carlos Amarilla no jogo em que o Boca Juniors eliminou o Corinthians nas oitavas de final da Libertadores de 2013. Fica claro na conversa que a arbitragem fora "encomendada". Na partida, Amarilla anulou dois gols legítimos do Corinthians e deixou de marcar um pênalti claro em favor do clube brasileiro, o que resultou na sua eliminação da competição, de cujo título, por sinal, era o detentor. Na mesma gravação, Grondona gabava-se de ter conseguido arranjar, também, a arbitragem de um jogo entre Independiente e Santos, em 1964, que resultou na eliminação do clube brasileiro da Libertadores. Há muitos outros casos semelhantes na Libertadores, lamentavelmente, ainda que sem uma gravação que evidencie a manipulação de resultados. Dois deles, ocorridos em Porto Alegre, são notórios. Em 2002, pelas semifinais da Libertadores, jogaram, no Olímpico, Grêmio e Olímpia. A decisão de quem se classificaria para a decisão foi feita nos tiros livres da marca do pênalti. Numa das cobranças, o goleiro do Grêmio, Eduardo Martini, fez uma grande defesa. O árbitro, no entanto, sem que tivesse havido nenhuma irregularidade no lance, mandou voltar a cobrança, que, então, foi convertida, eliminando o Grêmio da competição. O detalhe da situação é que o Olímpia, naquele ano, completava o seu centenário, e o presidente da Conmebol, Nicolas Leóz, paraguaio como o clube, se empenhou para que ele fosse campeão, o que acabou acontecendo. Em 2006, no Beira-Rio, ocorreu um dos exemplos mais escandalosos de resultado manipulado na Libertadores. Pelas oitavas de final da competição, jogaram Inter e Nacional, do Uruguai. O Nacional teve dois gols legítimos anulados. Caso os gols fossem consignados, e o Nacional vencesse por 2 x 0, ele teria eliminado o Inter da Libertadores. Com o esbulho praticado contra o clube uruguaio, o Inter foi adiante na competição, e acabou campeão. Nos dois casos citados, ficou por demais evidente que se tratavam de arbitragens "encomendadas". Só faltou uma gravação que confirmasse o que todos perceberam. O futebol, lastimavelmente, não é uma ilha. Assim como na sociedade, a corrupção espalha nele os seus tentáculos. Fatos como os aqui relatados, comprometem a credibilidade do futebol. Dentro e fora de campo, o esporte preferido da maioria precisa de uma faxina ética.