segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Modismos alimentares

A revista "Veja", quando deixa de lado o seu panfletarismo rastaquera de direita, até é capaz de publicar algum material interessante. Esse é o caso da entrevista das "páginas amarelas" de sua mais recente edição. Nela, o filósofo americano Alan Levinovitz se debruça sobre um dos fenômenos sociais da atualidade, os modismos alimentares. Particularmente, me inquieta a escalada cada vez maior do proselitismo em torno da "alimentação saudável", cuja consequência é restringir, de forma crescente, as opções das pessoas à mesa. De uma hora para outra surgem "estudos científicos" sustentando os males para a saúde de certos alimentos ou aditivos. Assim, ganham corpo comportamentos alimentares como o vegetarianismo e as mais diversas dietas restritivas. Uma afirmação corrente nos dias de hoje é a de que "os seres humanos são o que comem". Levinovitz desfaz essa ideia, que, declara, com razão, é apenas acreditar em mágica. Ela leva à conclusão absurda de que alguém pode ser melhor ou pior dependendo do que come. Muitas pessoas se sentem culpadas por não comerem bem, o que, para Levinovitz, é ridículo. Os que lêem esse texto já devem ter percebido, por exemplo, a apologia que se faz, ultimamente, de produtos sem glúten ou lactose. No caso do glúten, esclarece Levinovitz, ele tem de ser evitado pelas pessoas portadoras da doença celíaca, que representam, aproximadamente, 1% da população. Fora desse grupo específico, só 3% a 5% das outras pessoas poderá desenvolver reações ao glúten. Portanto, todos os demais não tem nenhuma necessidade de evitar a ingestão da substância. Levinovitz rebate outros mitos em torno do assunto. O filósofo reconhece que o consumo excessivo de açúcar é um problema sério, mas revela que não há nenhuma comprovação científica da necessidade de eliminá-lo totalmente da dieta. Outra abordagem feita por Levinovitz é em torno dos que retiram carnes de sua dieta por serem contra a violência e o abate de animais. O fato de os animais serem mortos para servirem de alimento, destaca Levinovitz, não significa que eles farão mal ao organismo, pois maldade moral não se converte em prejuízo à saúde. Da mesma forma, Levinovitz salienta que dizer que alimentos orgânicos ajudam a prevenir o câncer não passa de um mantra religioso. Essa afirmação remonta ao conceito de que, num passado distante, tudo era natural, e todos eram mais saudáveis, o que não é verdade. Por fim, Levinovitz garante que a indústria alimentícia não é ameaçada por tais modismos, já que as mesmas empresas que vendem itens orgânicos são as que comerciam os que não se enquadram nessa classificação. Portanto, relaxe em sua preocupação com o que come. Afinal, como bem destaca Levinovitz em meio à sua entrevista, comer não é só um  hábito para ser saudável e manter o peso, é, também, divertir-se com amigos, desfrutar cultura e história. "Não podemos transformar os alimentos em remédios", afirma Levinovitz. Não é preciso pensar muito para concordar com a assertiva.