quinta-feira, 26 de maio de 2011

O veto ao kit anti-homofobia

Por envolver preconceitos, conceitos, princípios, dogmas religiosos e opiniões as mais diversas, o chamado "kit anti-homofobia", material elaborado pelo Ministério da Educação para distribuição nas escolas, no ensino médio, foi cercado, desde o anúncio de sua existência, por intensa polêmica. O grande barulho em torno do assunto começou a partir de declarações do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), conhecido por suas posições homofóbicas. Depois de muito se discutir o tema em todo o país, a presidente Dilma Roussef (PT) decidiu vetar o kit, atendendo a apelos de parlamentares evangélicos. O curioso é que tal decisão se dá simultaneamente à eclosão do escândalo envolvendo o súbito enriquecimento do ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, Antônio Palocci Filho. Como se sabe, o governo federal pretende, a todo custo, impedir que seja instalada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista para tratar do assunto. Com isso, o veto do kit veio bem a calhar, pois em agradecimento ao afago presidencial, os parlamentares evangélicos negariam suas assinaturas para a instalação da CPI. A medida tomada pela presidente, é claro, vem ao encontro de obscurantistas de todos os matizes, permanentemente prontos para tentar impor suas crenças e visão de mundo para a toda a sociedade. Não foram poucos os artigos escritos em jornais e as declarações prestadas à imprensa por parte de tais figuras, defendendo os princípios éticos e cristãos da sociedade brasileira que, no seu entender, estariam ameaçados pelo kit. O episódio diz muito da maneira como a sociedade brasileira encara certas situações. Toda vez que um assunto envolve sexo ou aspectos comportamentais da vida dos indivíduos, logo surgem os arautos da moral e dos "bons costumes" para cobrar ações censórias por parte dos governos. Certos grupos religiosos aferram-se à idéia de que possuem o direito de estabelecer o que é certo e o que é errado, de impor seus conceitos e práticas de vida, escorados em revelações pretensamente "divinas". Num país marcado pela longa convivência com ditaduras e com uma população constituída, em sua maioria, de pessoas de baixo nível cultural e instrucional, não espanta que tais posturas ganhem adeptos. Porém, os obscurantistas e obtusos alcançaram uma vitória enganosa. A história não anda para trás, com ou sem kit. Há quarenta ou cinquenta anos, por exemplo, uma mulher solteira que engravidasse era colocada para fora de casa pelo próprio pai, com o intuito de lavar a honra, pretensamente ultrajada, da família. Atualmente, meninas ainda na adolescência dormem com seus namorados em casa, com o consentimento dos próprios pais. Se alguém perdeu no atual episódio, não foram os homossexuais, que continuarão ampliando seus espaços de cidadania. O Brasil é que desperdiçou uma chance de se mostrar um país livre da influência dos defensores do atraso e do medievalismo de corte religioso. No entanto, no futuro, os avanços das chamadas minorias, estarão plenamente consolidados. Já Dilma Roussef, Jair Bolsonaro e todos os que incentivaram e apoiaram o veto ao kit estarão condenados ao limbo da história, que é o lugar adequado para os que se vergam diante de interesses menores e mesquinhos.