sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Assuntos massacrantes

Muito se fala, no Brasil, sobre liberdade de expressão e imprensa livre, e da necessidade de garanti-las e protegê-las. Porém, a imprensa não é um elemento neutro, e a linha editorial dos veículos de comunicação traduz a visão de mundo de seus proprietários e a ação de grupos muito estruturados e influentes. Nos últimos dias, dois assuntos, um de cobertura nacional e outro de abrangência estadual, demonstram isso exemplarmente. Primeiro, no plano nacional, a cobertura massiva que vem sendo dada aos 10 anos do 11 de setembro, data que marca o atentado às torres do World Trade Center, em Nova Iorque. Trata-se de um fato relevante, sem dúvida, mas cuja importância foi, desde sua ocorrência, maximizado, por ter atingido os Estados Unidos. O excessivo alarde em torno do assunto reflete a vassalagem do mundo ocidental em relação aos americanos. O fato foi traumático, é claro, e três mil pessoas perderam suas vidas no atentado. Porém, o mundo convive, rotineiramente, com guerras e conflitos que resultam num número maior de mortos, sem que se faça tanto estardalhaço em torno disso. A cobertura do 11/09 pela Rede Globo é um exemplo desse exagero. No último domingo, o programa "Fantástico", dedicou quase toda a sua edição ao assunto. De lá para cá, há reportagens sobre o ataque às torres gêmeas em todos os noticiários da Globo, e alguns de seus jornalistas viajaram para os Estados Unidos especialmente para produzir matérias sobre o fato. Pode-se imaginar, então, o que será a cobertura no próximo domingo, quando se completarão os 10 anos do ato terrorista. Haja paciência para tantas reportagens e análises sobre o mesmo assunto. Passemos, então, para o âmbito estadual. Estamos no mês de setembro, o qual, no dia 20, marca a comemoração da chamada "Revolução Farroupilha", estranha reverência a um evento fracassado, em que os separatistas acabaram vergados pelas forças do Império. Durante quase todo o mês, os cultuadores das tradições gauchescas e do denominado "nativismo" se reúnem num parque de Porto Alegre para realizar suas "bailantas", comer muito churrasco e preservar o que entendem serem as "raízes" da cultura do Rio Grande do Sul. O que se vê, na verdade, é que o movimento tradicionalista gaúcho ganha espaço massivo em todos os meios de comunicação do Estado, para propagar sua idéia de que se deve perpetuar e zelar pelo que diz ser a identidade cultural do Rio Grande do Sul. Trata-se de uma pregação insistente e que não admite contestação, num processo de cunho fascistóide, do tipo "Rio Grande do Sul, ame-o ou deixe-o", que procura impor um padrão cultural único para o Estado, ignorando as diversidades. Está mais do que claro que muitas pessoas nascidas no Rio Grande do Sul não se identificam com as coisas "gaudérias", nem reconhecem no gaúcho pilchado uma tradução fiel do habitante típico do Estado. Mesmo assim, os veículos de comunicação cobrem o assunto amplamente, como se toda a população cultivasse o apreço por tais manifestações. Como se vê, tanto num caso como no outro, a tão propalada liberdade de imprensa não se faz presente. No primeiro caso, a imprensa está apenas a refletir a visão de mundo americanófila dos proprietários dos meios de comunicação. No segundo, está a serviço de um grupo fortemente estruturado e aparelhado que se apoderou dos canais de expressão da sociedade para impor sua idéia do que seja o Rio Grande do Sul. Num e noutro caso, o cidadão não está sendo corretamente informado, mas sim massacrado por um volume exagerado de dados sobre assuntos cuja efetiva importância não justificariam tão ampla cobertura.