sábado, 10 de agosto de 2013

Lógica capitalista

Para o capitalismo, tudo se reduz a números, a uma relação custo-benefício. Sua palavra-chave é "lucro". O termo que não suporta ouvir é "prejuízo". Essa lógica se estende, até mesmo, às pessoas, vistas, primordialmente, como consumidores. Não há lugar para o humanismo na prática capitalista, e qualquer contestação a esse estado de coisas é tachada, por seus defensores, de "teoria superada", "clichê de esquerda" e outras conceituações do gênero. Discorro sobre isso a propósito da resenha feita pelo jornalista Jerônimo Teixeira, publicada na edição dessa semana da revista "Veja", sobre o livro de seu colega Leandro Narloch, "Guia Politicamente Incorreto da História do Mundo". Conforme a resenha, em seu livro, Narloch realiza a reabilitação do capitalismo, do imperialismo e, até, dos agrotóxicos! Narloch é ex-repórter de "Veja", e segue à risca o ideário da publicação. São de sua autoria os best-sellers "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil" e "Guia Politicamente Incorreto da América Latina", este último escrito em parceria com Duda Teixeira, editor de "Veja". Segundo Jerônimo Teixeira, em todos os seus livros, Narloch apresenta a história sob uma perspectiva que diverge da "sempre previsível ladainha dos livros didáticos, na qual os culpados são sempre os capitalistas, os imperialistas, as elites". Em seu novo livro, Leandro Narloch, ainda que não negue as atrocidades históricas do colonialismo, atribui a responsabilidade pelas mazelas do continente africano, tais como guerras civis, golpes de estado e conflitos étnicos, aos próprios africanos, principalmente os ditadores que seguiram a "desastrosa cartilha do dirigismo estatal e do isolacionismo econômico". Narloch não poupa nem mesmo o pacifista Mahatma Gandhi, pois afirma que sua insistência na autossuficiência econômica e em modelos improdutivos de agricultura de subsistência, levaria a Índia a miséria depois de sua morte. O Dalai-Lama e a Madre Teresa de Calcutá, duas outras personalidades pacifistas, também sofrem o ataque de Narloch. Para o autor do livro, o que, de fato, combateu a miséria, foi o uso intensivo de agrotóxicos e a Revolução Industrial que, considera, diminuiu, a "longo prazo", a exploração do trabalho infantil. Em sua colocação mais ousada, Narloch faz a defesa da bomba atômica. O jornalista sustenta a ideia, com a qual concordo, de que as armas atômicas, pelo seu alto poder destrutivo, coíbem os países que as possuem de efetivamente entrarem em guerra. O problema não está aí, e sim, no fato de que Narloch considera que as bombas jogadas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasáki, em 1945, salvaram vidas. O argumento de Narloch é que uma invasão militar convencional do Japão custaria a vida de muito mais japoneses do que os 200 mil assassinados pelas bombas de Hiroshima e Nagasáki. Mais uma vez, estamos diante da lógica capitalista que reduz tudo a números, lucros, prejuízos. Nessa visão de mundo, os seres humanos são apenas referências estatísticas, destituídos de qualquer dignidade. Para Narloch, e os que como ele pensam, afirmações em contrário são "clichês politicamente corretos de esquerda".