segunda-feira, 4 de abril de 2011

Lucrando com a saúde

Poucas coisas podem ser mais ignóbeis do que transformar a saúde, um direito universal, em vil fonte de lucro. Infelizmente, nem todos pensam assim. A última edição da revista "Veja" traz, em suas páginas amarelas, uma entrevista com o americano Robert Fogel, Prêmio Nobel de Economia em 1993. Fogel acha que o setor de saúde será o grande propulsor da economia do século 21. O economista diz que a cadeia produtiva nessa área é das mais extensas e que, com os "estímulos adequados", calcula que o impacto da saúde no PIB dos Estados Unidos poderá chegar a algo como 2,5% a 3% ao ano. Fogel considera que isso representa um "enorme impulso para a economia". Em valores de hoje, esse percentual significaria uma adição anual à riqueza americana de 438 bilhões de dólares, o equivalente ao PIB da Suécia. Perguntado sobre como os mais pobres podem se beneficiar dos avanços na saúde, Fogel diz que "infelizmente" nunca haverá igualdade absoluta entre ricos e pobres nesse campo. Segundo o economista, a única forma de prover acesso à saúde aos mais pobres é construindo hospitais para os muito ricos, pois, mesmo que os mais aquinhoados não precisem deles, já que podem se tratar em outros países, se suas instalações estiverem disponíveis, poderão "em algum momento" atender também os menos abastados, por meio dos planos de saúde. Em algum momento? Aleatoriamente? Pois é, tais idéias são de um ganhador do Prêmio Nobel! Um antiácido, por favor!

Previdência complementar

O governo do Rio Grande do Sul está preparando um projeto de lei para modificar as regras da previdência como forma de equilibrar as contas do Estado. O projeto ainda não está inteiramente definido, mas entre as possibilidades estão a fixação de um teto salarial para os aposentados e pensionistas e a criação de uma previdência complementar, que receberia contribuições de servidores interessados em elevar os seus ganhos futuros. Já vimos esse filme. A alegação é sempre a mesma, isto é, de que a situação previdenciária está "insustentável". A novidade é que, dessa vez, quem planeja tal medida é um governo do PT, comandado por um dos maiores pensadores da esquerda brasileira, Tarso Genro. Vira e mexe e os vilões dos supostos déficits financeiros dos governos, estaduais e federal, são sempre os aposentados e pensionistas. No entender dos governantes, é preciso atirá-los à miséria para poder salvar os combalidos cofres públicos. Como disse, com muita propriedade, o diretor de previdência da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Cláudio Luís Martinewsky, a intenção do governo significa um enfraquecimento do Estado. Martinewsky lembra que todas as experiências de previdência complementar que foram feitas até hoje, como na Argentina e no Chile, foram totalmente desastrosas, pois isso é um projeto do mercado financeiro, que visa ao lucro. O diretor da Ajuris tem inteira razão. Ao abrir mão de uma obrigação que é inteiramente sua, o governo lava as mãos e entrega os aposentados e pensionistas nas mãos dos tubarões do mercado. Ao longo dos anos, muitas vezes se ouviu a defesa da necessidade de implantat tais medidas. Porém, quem o fazia eram os governantes de centro e de direita. Ouvir o mesmo discurso vindo de um governo liderado por um partido que leva em seu nome a palavra "trabalhadores", é absolutamente chocante.