sábado, 23 de novembro de 2013

O radicalismo de Bachelet

A revista "Veja" segue, a cada semana, com sua incansável defesa do capitalismo e da "sociedade de mercado". Seu radar está voltado não só para o Brasil, mas para qualquer lugar do mundo onde algum governo se guie por outros parâmetros. Nesse caso, os adjetivos são sempre duros, pois não há algo que "Veja" suporte menos do que contestações ao capitalismo selvagem. A mais nova vítima da ira da publicação, na edição que chegou hoje às bancas, é a candidata a presidente do Chile, Michelle Bachelet. Ela ganhou o primeiro turno das eleições, e deverá ter sua vitória confirmada no segundo. Bachelet já presidiu o Chile de 2006 a 2010 e teria sido, segundo a revista, a maior representante da chamada "esquerda vegetariana", expressão criada pelo direitista peruano Álvaro Vargas Llosa para definir políticos da América Latina que, embora defendessem ideias socialistas, mantinham políticas "pragmáticas" e "respeitavam as instituições democráticas". Como tal, se contrapunham ao grupo dos "carnívoros", como o falecido venezuelano Hugo Chávez e o boliviano Evo Morales. No  entender da revista, Bachelet, embora ainda distante de Chávez e Evo, está mais "radical". Tudo porque suas propostas de campanha ameaçam o modelo econômico que, conforme "Veja", colocou o Chile "na porta de entrada do Primeiro Mundo". Bachelet propõe reformar a Constituição, permitir a reeleição, eliminar o lucro na educação, promover o avanço estatal no sistema de aposentadorias, reduzir os estímulos para investidores estrangeiros e nacionais e elevar impostos às empresas. Para qualquer pessoa que analise tais propostas com discernimento, elas representam um avanço na direção da justiça social. Para "Veja", no entanto, são demonstrações de radicalismo. O lucro na educação é uma ignomínia, por comerciar com um dos mais nobres valores humanos. A participação do governo no sistema de aposentadorias é uma imposição moral de qualquer país. Os trabalhadores não podem ter o seu futuro preso, apenas, a planos de previdência privada, como deseja "Veja" no seu modelo de sociedade ideal. A redução de estímulos governamentais para empresários é outra medida elogiável. O governo tem de agir para mitigar os problemas sociais, não para subsidiar investidores privados. A elevação de impostos para as empresas, segue na mesma linha, pois quem mais arrecada, deve dar uma maior contribuição. O que "Veja" não esclarece aos seus leitores é que o atual presidente do Chile, Sebastian Piñera, é um milionário que aplicou em seu mandato todo o receituário neoliberal. Por isso mesmo, sua candidata foi facilmente batida por Bachelet no primeiro turno. Não é de hoje que os eleitores dos países da América do Sul se inclinam à esquerda do espectro político. Se, como aconteceu no Chile, experimentam eleger um candidato de direita, logo se arrependem e voltam atrás. Brasil, Argentina, Uruguai, Equador, Bolívia e Venezuela são governados pela esquerda, e o Chile prepara-se para juntar-se ao grupo. Todos esses governos enfrentam marcação cerrada da imprensa conservadora, que tenta desmoralizá-los e desestabilizá-los, sempre de modo infrutífero. A preferência dos sul-americanos pela esquerda não é um modismo, é convicção. Para o bem dos países por ela governados e desconsolo de "Veja", que continuará com suas teses caindo no vazio.