segunda-feira, 4 de junho de 2012

O mercado da fé

O Brasil vive, de alguns anos para cá, o fenômeno da expansão das chamadas igrejas evangélicas. Por meio de  canais próprios de televisão ou comprando espaços em emissoras, e com várias rádios espalhadas pelo país, as diversas ramificações evangélicas levam sua mensagem do Oiapoque ao Chuí. Com ênfase na busca da ascensão material dos fiéis, as igrejas evangélicas tem atraído multidões. As pessoas que aderem a essas correntes religiosas são levadas a contribuir com o dízimo, uma quantia que destinam á igreja, e que atinge montantes milionários, capazes de financiar a construção de templos enormes. Alguns pastores evangélicos tornam-se verdadeiras estrelas, alcançando grande popularidade. Esse é o caso, por exemplo, do pastor Silas Malafaia, que há trinta anos apresenta programas de televisão. Malafaia é vice-presidente do Conselho Interdenominacional de Ministros Evangélicos do Brasil (Cimeb), que congrega cerca de 8500 pastores de quase todos os ramos evangélicos. A edição dessa semana da revista "Veja" traz, em suas página amarelas, uma entrevista com Malafaia. Para quem tenha um juízo minimamente crítico, a leitura dessa entrevista é uma experiência traumática. Seu conteúdo é um show de descaramento e desfaçatez. Entre outras coisas, Malafaia destaca, vendo como algo positivo, é claro, o fato de que os padres do movimento carismático católico adotaram uma maneira de pregar que os pastores evangélicos já utilizam há mais de quarenta anos. Como se sabe, essa "maneira de pregar" se caracteriza por uma grande teatralidade e enorme exaltação, capaz de impressionar vivamente os incautos. Malafaia diz que desafia qualquer um a lhe apresentar uma organização que recupere mais pessoas do que as igrejas evangélicas e destaca que elas fazem isso a um custo zero para o governo. Em função disso, revolta-se com aqueles que querem cobrar taxas e impostos das igrejas. Afinal, sustenta Malafaia, os evangélicos não cobram um centavo sequer do governo para livrar as pessoas das drogas, da prostituição, da bebida, e ainda tem impacto positivo na vida profissional dos fiéis. Silas Malafaia acrescenta que muitos empregadores fazem questão de só contratar evangélicos, pois os pastores ensinam ao fiel que ele, quando está trabalhando, deve servir ao patrão como se estivesse servindo ao próprio Deus, já que é o que a Bíblia ensina. As barbaridades ditas por Malafaia prosseguem ao longo da entrevista, como quando admite que as igrejas evangélicas praticam o exorcismo, mas não podemos nos ocupar de todas. Fixemo-nos então, nos trechos finais, que demonstram claramente quem é Malafaia e quais são os seus propósitos. Depois de, numa das perguntas iniciais, ter dito que está construindo um templo lindo, com ar-condicionado central, ao custo de R$ 4 milhões, Malafaia revela que, em 2011, sua igreja arrecadou R$ 20 milhões. O salário que paga para os pastores, dependendo da função e do tempo dedicado varia entre R$ 4 mil e R$ 22 mil. Malafaia justifica dizendo que "uma pessoa não pode ser incumbida de cuidar de vidas se a cabeça dela estiver focada em arranjar dinheiro para pagar as contas". A verdadeira face de Silas Malafaia aparece nas últimas perguntas. Ao ser perguntado se está rico, Malafaia revela que tem uma "boa casa" no Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, pela qual pagou R$ 600 mil, e que hoje vale R$ 2,5 milhões. Possui, ainda, "alguns apartamentos" e uma casa em Boca Raton, no estado da Flórida (EUA), que diz ter comprado para pagar em trinta anos. Em 2011, Malafaia ganhou de presente de um "parceiro" um Mercedes-Benz blindado. Em 2010, comprou um jato Gulfstream, ano 1986, por U$ 3 milhões. Porém, Malafaia sustenta que o jato não pertence à igreja nem a ele, mas à associação que administra as obras sociais e custeia o tempo de televisão. Malafaia declara que nunca será candidato a nada, nem a "assistente de carimbador de vereador", mas que quer influenciar pessoas e, por isso mesmo, não sataniza partido político nem candidaturas, já tendo votado em Fernando Henrique Cardoso, Luís Inácio Lula da Silva e José Serra. O fecho de ouro da entrevista se dá com a admissão, por parte de Malafaia, de que fez um implante de cabelo. Malafaia disse que o implante ficou "muito bom" e que custou R$ 20 mil. "Fiz com o mesmo médico do Zé Dirceu e do Agripino", revelou, referindo-se ao ex-ministro José Dirceu e ao senador José Agripino Maia (DEM-RN). Depois de ler a entrevista, só mesmo um imbecil poderá se deixar levar pela retórica de Malafaia. O sucesso dele e de outros pastores do gênero, é uma prova cabal de que o ser humano tem propensão a ser feito de bobo. São espertalhões que prosperam fazendo os outros de otários.