segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O lucro no ensino

Na chamada "sociedade de mercado", tudo deve visar ao lucro. Em tal modelo de sociedade, a livre iniciativa não pode ser ameaçada e o Estado não deve interferir no mercado. Com a prevalência do modelo capitalista, ditada pelo fim da Guerra Fria, vivemos tempos em que tudo é privatizável, mesmo coisas que antes eram de nítida responsabilidade estatal. É o caso, por exemplo, das estradas. Sua construção e conservação são deveres óbvios do poder público, mas, nos dias tresloucadamente neoliberais de hoje, o indefeso cidadão é obrigado a pagar os execráveis pedágios, que assaltam o seu bolso, enriquecem as concessionárias do serviço, e, o que é pior, não garantem, mesmo assim, estradas em boas condições. Nessa ânsia do lucro fácil às custas dos cidadãos desprotegidos, nem mesmo o ensino, antes dotado de uma condição de idealismo, escapou. As consequências disso já se fazem sentir no Chile, país que se deixou seduzir pelas idéias privatistas. Há mais de quatro meses, o Chile enfrenta a maior crise educacional de sua história. Não é difícil entender o porquê. O sistema educacional chileno, tão elogiado pelos direitistas, resulta em universidades com um alto custo em proporção á renda da população. O governo chileno investe nas universidades apenas 0,3% do PIB, um dos menores índices dentre todos os países do mundo. Com isso, os cidadãos e as empresas gastam 1,7% do PIB com o ensino superior. Para poderem formar os filhos, muitas famílias recorrem a empréstimos. O governo do Chile criou um financiamento para estimular o ingresso dos jovens pobres e de classe média nas faculdades, porém a taxa de juros cobrada é elevada. A consequência é que os estudantes se formam devendo quantias exorbitantes. Afora isso, o crédito cobre apenas parte das mensalidades e, para financiarem o restante, as famílias também acabam acumulando divídas. O fato do Chile ter o melhor resultado da América Latina no último Pisa, teste de qualidade da educação, não absolve o perverso sistema de ensino do país. Os estudantes chilenos se rebelaram contra os que transformaram a nobre tarefa do ensino em apenas mais uma forma de obter lucro. Uma das faixas dos manifestantes chilenos expressava: "Não mais educação de mercado". Camila Vallejo, presidente da Federação de Estudantes da Universidade do Chile disse: "Mostramos para o mundo que nossa educação não era o exemplo que se pensava". Camila e seus companheiros de luta exigem a proibição do lucro no ensino, no que estão absolutamente certos. Apesar de publicações de direita, como a revista brasileira "Veja", entenderem que isso poria abaixo um sistema de ensino  que é "o mais bem-sucedido da região", não se pode negar que a nobre tarefa de educar e a vil busca do lucro são absolutamente incompatíveis. A demonstração do quanto era falaciosa a idéia de que o Chile tinha um sistema educacional modelar, por certo, deverá servir para conter novos ímpetos privatistas em outros países. Educação é dever do Estado, não uma atividade mercantil como qualquer outra.