segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Opiniões variáveis

A chamada "grande imprensa" é muito curiosa nas suas análises. Seus conceitos são muito flexíveis, variando conforme os personagens envolvidos. Vejamos o caso do continuísmo político. A imprensa conservadora vocifera quando governantes de esquerda cumprem sucessivos mandatos, ainda que isso resulte da decisão soberana dos eleitores. Para justificar sua contrariedade, tais veículos de comunicação denunciam que o êxito eleitoral, nesses casos, se dá pela perseguição à "imprensa independente" (eufemismo para o jornalismo de direita) e à oposição, uso da máquina do governo, adoção de medidas populistas, entre outros fatores. Se o continuísmo for de um político liberal, no entanto, a análise muda inteiramente de tom. Isso ficou comprovado, mais uma vez, com a conquista da primeira-ministra da Alemanha, Ângela Merkel, de um terceiro mandato sucessivo. Ângela Merkel é uma política de linha conservadora, e comanda a maior economia da Europa. Em todas as apreciações feitas sobre ela, antes e depois das eleições, foi brindada pela grande imprensa brasileira com fartos elogios à sua competência, firmeza nas decisões, defesa dos princípios liberais, seus estilo avesso ao populismo. A mesma imprensa também derramou-se em considerações elogiosas aos onze anos em que a execrável Margareth Thatcher foi primeira-ministra da Inglaterra, nada vendo de inconveniente em tão larga permanência no poder, período que ela utilizou para agredir os interesses da massa trabalhadora e favorecer as elites, sem contar sua explícita amizade com o ditador sanguinário do Chile, Augusto Pinochet. São os mesmos veículos de imprensa que não disfarçavam sua simpatia por boçais como os ex-presidentes dos Estados Unidos, Ronald Reagan e George Walker Bush. Os mesmos veículos, também, que nada viram demais quando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comprou 200 parlamentares para aprovar, em benefício próprio, o instituto da reeleição, nunca adotado antes no país, obtendo, assim, um segundo mandato consecutivo, mas que denunciavam, histericamente, que Luís Inácio Lula da Silva faria o mesmo para ter um terceiro período seguido no cargo, o que acabou não se confirmando. Portanto, daqui por diante, o público deve ficar atento para essas diferenciações. Se um político de esquerda ficar por mais de um mandato no cargo, isso é "continuísmo", se for de direita é "estabilidade democrática". Pobre opinião pública brasileira, que tem de se servir de uma imprensa tão facciosa.