sábado, 28 de dezembro de 2013

Conservadorismo

Estamos acostumados a ideia de que o Brasil é um país de pessoas liberadas, com tendência à libertinagem, onde a sensualidade é a marca dominante. Trata-se, é claro, de um estereótipo, não confirmado pela realidade. Num país onde o exercício da democracia ainda tem ares de novidade, o conservadorismo persiste nas relações sociais. O psicanalista italiano, radicado no Brasil, Contardo Calligaris, em entrevista ao jornal Zero Hora, em sua edição de amanhã, que, como de hábito, já circula na véspera, diz que o Brasil é um país "careta" num campo em que ele não imagina que seja, isto é, o das fantasias sexuais. Calligaris constata que os brasileiros têm a impressão de que sacudir a bunda durante os quatro dias de Carnaval ou usar um biquíni um pouco mais ousado na praia seja uma grande manifestação de liberalismo. A prática do topless, mesmo no "avançado" Rio de Janeiro não é aceita, e se transforma num evento. O psicanalista dá outra demonstração da "caretice" brasileira, ao citar o fato de que o número de clubes de swing, por casal de habitantes, no Brasil é irrisório, se comparado com a Itália, por exemplo. Outro evidência da falta de naturalidade dos brasileiros para lidar com os assuntos da sexualidade foi a reação, percebida por Calligaris, de pessoas que assistiam ao filme "O Azul é a Cor Mais Quente", quando da exposição na tela da famosa cena em que, durante nove minutos, as duas protagonistas entregam-se a uma ardente relação. Contardo Calligaris percebeu que as pessoas, em vez de observarem a cena em silêncio, se agitavam, se mexiam na cadeira, davam um risinho nervoso, comentavam com quem estava ao lado. Não conseguiam assistir à cena com respeito, como deveria ser. Demonstravam medo, transformado em riso nervoso. As colocações de Calligaris vem na mesma direção do que penso sobre esse Brasil "liberado" de que tanto ouvimos falar. Não passa de uma imagem falsa, insistentemente alardeada por alguns com o intuito de justificar medidas que restituam uma "moralidade perdida". Na verdade, somos um país, ainda, muito reprimido. Entre o mito e a realidade, há um caminho muito longo a percorrer até que o Brasil deixe de ser um país conservador.