quinta-feira, 2 de junho de 2011

A Marcha pela Família

Os arautos do atraso e do preconceito não se dão por vencidos.  Passados 47 anos da "Marcha com Deus e a Família pela Liberdade", que ajudou a impulsionar a deflagração do execrável golpe militar de 1964, surge, agora, a "Marcha pela Família", de nome mais curto mas resultante dos mesmos grupos e buscando idênticos objetivos. Tal como em 64, o que os defensores da família querem é impor a toda a sociedade sua visão de mundo e defender a manutenção de seus privilégios. Há 47 anos, o alvo era a pretensa ameaça comunista. Hoje, o inimigo a ser combatido é a lei 122, que criminaliza a homofobia. Ancorados em seus preceitos religiosos e preconceitos, os ativistas da tal marcha, pregadores de diversas crenças, querem continuar a exercer o que entendem ser um direito, ou seja, o de bradar e vociferar contra a homossexualidade, que consideram um pecado. Os defensores da marcha chegam a dizer que o Senado não tem poder para criar um "terceiro sexo", por meio de legislação. O Brasil parece condenado a retroagir, cada vez que se encaminha para notáveis avanços nos direitos sociais e na afirmação da cidadania. Tudo porque há pessoas que não se contentam em viver de acordo com suas próprias concepções, querem estendê-las a todos e perseguir quem nelas não se encaixa. Toda a pessoa é livre para crer no que bem entender. Há, até, quem acredite na existência de elfos e duendes! Por certo, é uma forma de escapismo, uma maneira de tornar a realidade menos dura, envolvendo-a num manto de idéias delirantes. Na mesma linha, todo e qualquer indivíduo pode aderir a uma religião ou seita e seguir suas pretensas verdades e revelações. O que não se pode, em hipótese alguma é, em nome do direito de professar uma fé e pregar sua doutrina, bater de frente com o direito dos demais cidadãos de estabelecerem suas escolhas de vida, ainda que isso fira seus dogmas religiosos. Aliás, o dogma já é, em si, algo que rebaixa a pessoa na sua condição de ser pensante e autônomo, pois é uma verdade pronta, que não pode ser discutida nem contestada, por estar, alegadamente, baseada em "revelações divinas". Com o nível de evolução cultural e científica que a humanidade já alcançou, não é possível conviver mais com tanto obscurantismo. Os governantes brasileiros, de olho apenas em votos e interesses de natureza política, muitas vezes cedem à chantagem de parlamentares que defendem as posições das diversas confissões religiosas. Isso não pode continuar. O Brasil não pode ser refém do atraso e do medievalismo. Cada um que cultive as suas crenças, mas sem tentar impor sua estreita e distorcida visão de mundo para toda a sociedade. Em vez de retrógradas marchas pela família precisamos, urgentemente, de uma "Marcha pela Cidadania Ameaçada".

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O autor se reserva o direito de moderar os comentários. Textos com conteúdo ofensivo ou linguajar inapropriado não serão publicados neste espaço.