sábado, 19 de novembro de 2016

A raposa cuidando do galinheiro

Vivemos uma época de glorificação da iniciativa privada e de desvalorização da estrutura estatal. A velha teoria de que é preciso aplicar políticas de austeridade nas finanças públicas, e a intenção de se implantar um Estado mínimo estão na moda, novamente. Empenhados em levar adiante o que prega a cartilha neoliberal, muitos governos contratam consultorias privadas para estabelecer os rumos da administração. Vista como algo natural pelos privatistas, essa conduta não é adequada ao interesse público. Em matéria publicada na edição de fim de semana do jornal "Correio do Povo", especialistas em administração pública destacam a inconveniência desse procedimento por parte dos governos. O professor de Administração Pública da Ufrgs, Aragon Érico Dasso Júnior, o classifica como um erro crasso. Afinal, salienta Dasso Júnior, os setores público e privado têm lógicas opostas. Enquanto na iniciativa privada se visa o resultado e o lucro, no setor público o fundamental é a questão social. Na mesma linha, o professor Adalmir Antonio Marquetti, do Departamento de Economia da PUCRS, alerta para o fato de que o poder público contrata consultorias por um alto custo mesmo possuindo uma burocracia estatal que, quase sempre, é mais qualificada que esses agentes privados. O mais incrível, ressalta Marquetti, é que, dessa forma, o poder público paga para que grupos e movimentos específicos, com interesses próprios, acessem dados estratégicos dos governos. Essas práticas, portanto, ferem os princípios que devem nortear a administração pública, entre eles o da legalidade e o da impessoalidade. Ainda bem que, em meio ao desvario neoliberal dos dias atuais, haja quem encare tais questões com lucidez. Para resumir a situação, de forma bem direta, o que se vê, nessas práticas administrativas, é a raposa cuidando do galinheiro. A grande vítima é a sociedade, golpeada por medidas que favorecem interesses de grupos em detrimento das aspirações da coletividade.

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