quinta-feira, 19 de julho de 2012

O trenzinho da alegria

O futebol brasileiro, que hoje comemora o seu dia, sempre foi brilhante dentro de campo, mas muito nebuloso fora dele. Se nos gramados foram gerados gênios, como Pelé e Garrincha, e craques como Leônidas, Zizinho, Didi, Nílton Santos, Rivelino, Zico, Romário, entre outros, nos bastidores nosso futebol é comandado por figuras suspeitas, para se dizer o mínimo. O recente episódio envolvendo o recebimento de propinas por parte de João Havelange e Ricardo Teixeira, ex-presidentes, respectivamente, da Fifa e da CBF, exemplificam bem esse panorama. Nesse sentido, no futebol gaúcho, um fato, nos últimos anos, chama a atenção. Trata-se do congresso técnico do Campeonato Gaúcho. Durante décadas, esse encontro, que serve para reunir os dirigentes dos clubes participantes do Gauchão para a discutir e formatar a competição, era realizado, num único dia, na sede da Federação Gaúcha de Futebol, no centro de Porto Alegre. Porém, nos últimos anos, essa situação mudou, e a reunião de dirigentes passou a realizar-se em locais como Punta del Este, Buenos Aires, Santiago, no Chile, e até num tour por cidades da Europa, sem que se saiba que conexão possam ter com a disputa do Campeonato Gaúcho. O próximo congresso técnico será no Caribe. Trata-se, na verdade, de um autêntico "trenzinho da alegria". O presidente da Federação Gaúcha de Futebol, Francisco Novelleto Neto, diz que fechou parceria com uma "grande empresa", que arcará com os custos da viagem para um grupo de 40 pessoas, e terá sua marca exposta em bonés e camisas durante a mesma. O roteiro de países a serem visitados ainda não foi definido. Cada um dos 16 clubes da primeira divisão do Rio Grande do Sul poderá enviar dois representantes para o encontro, quando serão conhecidos os grupos e as datas da competição. Novelleto declarou que a Federação Gaúcha de Futebol jamais usou verba própria em nenhuma das reuniões que realizou fora do país, pois sempre contou com a ajuda de patrocinadores. A questão principal não é essa. O que não se consegue entender é porque um congresso para tratar de um campeonato estadual é realizado fora do país, em lugares diferentes a cada ano, e sempre em localidades de forte apelo turístico. Afora isso, qual o interesse dos tais "patrocinadores" em proporcionar tamanha mordomia para os dirigentes de clubes? Esse dinheiro não seria melhor aplicado se fosse usado para, por exemplo, melhorar as condições de alguns estádios que apresentam gramados precários e acomodações inadequadas para a imprensa? Os congressos do Gauchão realizados no exterior, na verdade, são mais uma demonstração da desfaçatez com que se movem as elites em nosso país. Enquanto o torcedor sofre, chora, toma chuva ou expõe-se a um sol causticante por amor ao seu clube, os dirigentes usam o futebol para desfrutar de prazeres e obter vantagens. Um triste quadro que, no entanto, não recebe o devido repúdio da grande imprensa, envolvida que está, também ela, numa de teia de interesses pouco nobres que cercam o mundo do futebol.

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